segunda-feira, 1 de abril de 2002

Reflexões sobre uma indústria altamente rentável

Abril de 2002, Ciência Hoje
Especial "Drogas" - 1ª parte

Alicia Ivanissevich

A variedade de opiniões sobre como abordar o problema do crescente consumo de drogas no Brasil e no mundo é imensa. Mas existe consenso pelo menos quanto a um ponto: trata-se de uma das indústrias mais rentáveis do planeta, ultrapassando inclusive a de petróleo. A venda mundial de entorpecentes para usuários é estimada em US$ 150 bilhões - quantia próxima à gasta pelos consumidores de cigarro (US$ 204 bilhões) e do álcool (US$ 252 bilhões). É, com certeza, o mercado ilícito que mais movimenta dinheiro.

Em todo o mundo, o consumo de drogas não pára de crescer. Os Estados Unidos são certamente o maior consumidor, sobretudo de cocaína e anfetaminas (as vendas chegam a US$ 60 bilhões), seguidos de perto pela Europa. Paquistão, Tailândia, Irã e China respondem pelo maior número de usuários de heroína - os preços baixos, entretanto, impedem que as vendas atinjam US$ 10 bilhões. Em países ricos, como a Grã-Bretanha, as drogas que mais atraem os jovens são as consumidas ocasionalmente, como a maconha, o ecstasy, as anfetaminas e a cocaína.

Ninguém gasta mais com uma política antidrogas do que os Estados Unidos: US$ 35 a 40 bilhões anuais. Os resultados, no entanto, não são nada animadores. A repressão tem ajudado a inchar as prisões e a tornar mais corrupta a polícia norte-americana. Milhares de jovens negros e hispânicos acabam na cadeia: há mais deles na prisão do que na escola. Apesar de o governo insistir em afirmar que a estratégia de combate está funcionando (o consumo ocasional caiu e o uso de drogas pesadas se estabilizou, segundo órgãos oficiais), um terço dos norte-americanos com mais de 12 anos de idade admitiu já ter experimentado drogas no último ano.

Ainda sobre o modelo norte-americano, devemos lembrar que, nos Estados Unidos, o tabaco mata proporcionalmente mais fumantes do que a heroína destrói a vida de seus usuários; da mesma forma, o álcool faz mais vítimas fatais do que a cocaína.

A avaliação das estatísticas e das experiências conduzidas em diversos países aponta para uma questão central: as políticas atuais para o controle de entorpecentes não parecem adequadas. É importante aqui recordar as conseqüências da instituição da Lei Seca nos Estados Unidos (1920-1933), que proibia a venda de álcool e só admitia o consumo dentro de casa. Nesses 13 anos, ocorreu, na verdade, uma distorção do sentido original da lei: a proibição acabou encorajando a formação de gangues, aumentando a corrupção policial e disseminando o crime por todo o território norte-americano.

Em uma extensa análise publicada em julho/agosto de 2001, a revista inglesa The Economist destaca a necessidade de rever a legalização das drogas - não apenas a posse e o uso, como também o comércio - para reverter radicalmente o quadro de corrupção policial, danos à saúde, crimes e prejuízos sociais a elas associados.

Motivado pela repercussão do artigo da The Economist, nosso conselho editorial decidiu refletir sobre a questão, convidando, para comentá-lo, alguns especialistas no assunto. São pesquisadores de diversas áreas do conhecimento que apresentam suas argumentações em prol ou contra a descriminalização das drogas, ponderando os danos causados tanto aos usuários de drogas ilícitas quanto à sociedade. Suas opiniões não refletem necessariamente o pensamento dos editores.

Este especial pretende funcionar como um caleidoscópio, através do qual o leitor de Ciência Hoje poderá construir, a partir dos fragmentos por ele escolhidos, sua própria avaliação sobre o tema. Para isso vale ter em mente: as políticas antidrogas de alguns governos são, muitas vezes, mais prejudiciais para a sociedade do que as próprias drogas.

Fonte: Ciência Hoje nº 181 (Abril de 2002)

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