sexta-feira, 21 de agosto de 1998

Aposentado recupera sementes

21 de julho de 1998, Correio Braziliense

O funcionário aposentado do Itamaraty, Waldir Affonso da Costa, 61 anos, levou de volta, ontem, da Delegacia de Tóxicos e Entorpecentes (DTE) para a chácara 21 da Fazenda Mestre D'Armas, em Planaltina, onde mora, o carregamento de sementes de maconha que lhe rendeu, em 1994, seis meses de prisão.

Waldir fez a importação do produto da Hungria pensando em alimentar galinhas. Tanto que trouxe junto seis chocadeiras, que faziam parte do seu sonho - na época - de novo aposentado. Agora Affonso vai entrar com uma ação contra a União, pedindo uma indenização calculada em torno de R$ 10 milhões por danos morais e materiais.

Affonso comprou as sementes na Hungria - onde trabalhou durante quatro anos como funcionário administrativo do Itamaraty -, em março de 1994, e trouxe para o Brasil quando retornou em junho do mesmo ano, junto com a mudança da família. O transporte foi de navio, pelo Rio de Janeiro. Trinta sacos de nylon cheios. Daria para alimentar duas mil galinhas durante um mês.

Prisão

Dias depois da chegada em Brasília, a polícia invadiu o segundo andar do depósito da chácara de Waldir para recolher as sementes e levá-lo preso, por tráfico internacional de drogas. Passou dois meses na carceragem da Coordenadoria de Polícia Especializada (CPE) e quatro meses no Núcleo de Custódia da Papuda. "Minha mulher (Judith) e meus filhos (Paulo, que tinha dez anos na época, e Sofia, com 12 anos) passaram um dia inteiro detidos na delegacia", diz Waldir.

No dia 26 de novembro de 1996 veio a sentença. Depois de exames do Instituto Médico Legal (IML), a polícia conclui que as sementes não germinavam e não eram tóxicas. A devolução do produto ao dono foi determinada à DTE pelo ofício 1.937 do juiz da 2ª Vara de Entorpecentes do Tribunal de Justiça (TJDF), Marco Antônio da Silva Lemos.

Na ocasião, o advogado criminalista Divaldo Teófilo de Oliveira Neto entendeu que a decisão do juiz era normal. "A semente não possui o princípio ativo da maconha, o THC. É como comprar um revólver. Desde que a pessoa tenha o registro, não é crime mantê-lo em casa."

A decisão também foi comemorada pelo deputado ecologista Fernando Gabeira (PV-RJ), que teve 5,5 quilos de sementes de maconha, importados igualmente da Hungria, apreendidos em maio de 1996 pela Polícia Federal. Incentivado pela decisão do juiz ele entrou com um recurso pedindo a devolução do produto.

Depois de todos os transtornos e sofrimentos que passou, Waldir deixou de lado a idéia de criar galinhas. Mas agora, com a recuperação das sementes, pensa em retomá-la. Ele explica que "a semente do cânhamo (erva da família da Cannabis sativa, a maconha) desenvolve a plumagem das galinhas. Quando estão na fase de muda, as sementes aceleram o crescimento", diz.

"Naquela época, policiais chegaram a dizer que eu tinha pés de maconha plantados na chácara. Um absurdo. Como podia ser, se as sementes não germinam?", pergunta ainda hoje Waldir revoltado.

Fonte: http://www.gabeira.com.br/causas/subareas.asp?idSubArea=68&idArea=1&idArtigo=160

domingo, 16 de agosto de 1998

EUA têm “hemp bier”

16 de agosto de 1998, Folha de S. Paulo

Patrick Sabatier
Do Libération, em Lexington.
Tradução de Clara Allain.

"Ninguém bebe esta cerveja para ficar doidão", garante Tracy, a garçonete loiríssima da pizzaria Uno, em Lexington, ao freguês que acaba de lhe pedir uma Kentucky Hemp, a cerveja à base de cânhamo produzida na cidade. "Todo mundo sabe que ela não tem nada a ver com maconha."

Apesar disso, a palavra "hemp" (cânhamo) se destaca em letras enormes no rótulo da garrafa. Sobre o peito de um cavalo vermelho, o orgulhoso corcel exibe a folha de cânhamo de pontas alongadas e rendadas, tão conhecida dos adeptos do baseado.

Para não deixar margem a dúvidas, Bill Ambrose, o jovem executivo da Lexington Brewing Company, a "microcervejaria" que fabrica e comercializa esta Kentucky Hemp desde janeiro, gentilmente oferece ao visitante o folheto da Hemptech (rede de informações sobre cânhamo industrial), que enumera "os 25 mil usos conhecidos" do cânhamo. Esses incluem desde produção de roupas da grife Calvin Klein até o papel especial produzido na França pela gigantesca empresa de papel Kimberley-Clark. Até o início do século, Lexington foi o maior centro mundial de comércio de cânhamo. Durante dois séculos a Cannabis sativa, ao lado do Bourbon e dos cavalos puro-sangue, foi um pilar da prosperidade da região e motivo de orgulho de seus habitantes. Desde a chegada dos primeiros colonos ao Kentucky, no século 18, até a aprovação da lei que proibiu seu cultivo, em 1937, o produto foi a cultura mais lucrativa dos fazendeiros dos Estados Unidos. "Semeiem cânhamo por toda a parte e utilizem-no o quanto puderem", foi o conselho dado aos americanos pelo "pai da pátria", George Washington.

O plantio do cânhamo é, para os agricultores do Kentucky, a única alternativa ao tabaco, sua fonte principal de recursos e que, segundo eles, corre o risco de ser proibido. Tanto assim que 77% dos habitantes do Estado são favoráveis à legalização do cultivo do cânhamo.

Mas a idéia tropeça na hostilidade da DEA (órgão de combate às drogas do governo americano) e de todos aqueles que, por ignorância ou deliberadamente, metem a maconha e o cânhamo industrial no mesmo saco.

"Nossa cerveja não gerou nenhuma polêmica no Kentucky", garante Ambrose. "Todo mundo sabe que cânhamo e maconha são duas coisas diferentes. Mesmo meu tio, que tem 82 anos e é superconservador, sabe disso."

Gosto de avelã

"A primeira razão pela qual utilizamos o cânhamo é que ele dá um gosto ótimo à cerveja", diz Ambrose. A cerveja à base de cânhamo deixa um ligeiro sabor de avelãs. "É uma cerveja para o grande público, não para os especialistas", diz Brian Miller.

Desde o ano passado, outras cervejas à base de cânhamo apareceram no mercado americano: a Hemp Gold, produzida em Maryland, a Humboldt Hemp na Califórnia e a canadense Hemp Cream.

Fonte: http://www.gabeira.com.br/causas/subareas.asp?idSubArea=68&idArea=1&idArtigo=159

sábado, 1 de agosto de 1998

Quando a maconha cura

Agosto de 1995, Superinteressante

Está provado. Os efeitos medicinais da maconha beneficiam pacientes de câncer, AIDS, glaucoma e esclerose múltipla. Mas os médicos do mundo inteiro se vêem num dilema crucial. Como receitar um remédio que é proibido?

Rosângela Petta

Desde logo, é importante deixar bem claro: o uso de drogas como maconha e outras substâncias alucinógenas ou psicotrópicas, sem orientação médica, é perigoso. O vício das drogas prejudica os jovens e constitui um problema social. A forma de resolvê-lo é uma discussão em aberto, mas não é o tema principal da reportagem que você vai ler a seguir. Aqui, você será informado sobre os efeitos medicinais da maconha, entenderá por que os médicos desenvolvem cada vez mais pesquisas nessa área, e por que, muitos deles, concluíram pela recomendação do uso terapêutico dessa droga.

A comunidade científica começou a estudar a maconha a sério em 1964. Nesse ano, o pesquisador Raphael Mechoulan, da Universidade de Tel Aviv, em Israel, extraiu da erva natural uma substância chamada delta-9-tetraidrocanabinol. Era o THC, o principal responsável pelos efeitos da Cannabis sativa (nome científico da planta de maconha). Como também aprendeu a sintetizar o THC, Mechoulan viabilizou, pela primeira vez, o estudo sistemático de suas ações no corpo humano.

Há muito tempo se ouvia falar nas virtudes terapêuticas da erva. Na verdade, a sua história é quase tão antiga quanto a civilização: há seis mil anos, aparecem no mais antigo texto medicinal conhecido, o Pen Ts’oo Ching, chinês, sugestões de uso da planta. Ela era indicada para problemas como asma, cólicas menstruais e inflamações da pele. E assim foi até recentemente, afirma o bioquímico John Morgan, da Universidade da Cidade de Nova York. “Nos Estados Unidos, a asma, a dor e o estresse foram combatidos com chás e outros preparados de maconha (mas não cigarros) comercializados por grandes empresas, como Parke Davis, Eli Lilly e Squibb.” O negócio acabou em 1937, quando a erva foi proibida nos EUA por lei federal.

Após a descoberta de Mechoulen, a indústria voltou a se empenhar e, logo no início dos anos 70, surgiram os primeiros remédios à base de THC sintético, cujo uso é autorizado, em casos especiais, na Europa e nos Estados Unidos. Dois deles são fabricados atualmente: o canadense Nabilone e o estadunidense Marinol. Em forma de cápsulas, eles ocuparam um mercado em crescimento: o dos pacientes de câncer e de AIDS. É verdade que o THC também é benéfico em outros casos. Mas foi a gravidade dessas duas doenças que justificou a atenção dada à maconha como recurso terapêutico. A Cannabis não cura o câncer ou a AIDS. O que ela faz com eficiência é aliviar o sofrimento decorrente dessas doenças.

A partir de 1975, os médicos perceberam que o THC ajudava a superar crises de náusea e vômitos provocadas pela quimioterapia, tratamento que busca controlar os tumores cancerígenos. O mal-estar que decorre da quimioterapia pode se tornar intolerável se não for controlado e há pacientes que não conseguem dar continuidade ao tratamento. Por isso, o uso da maconha pode ser decisivo. Daí que na mais abrangente pesquisa estadunidense, feita pela Universidade Harvard em 1991, 70% dos cancerologistas perguntados responderam que recomendariam o uso da erva natural se esta fosse legalizada. Quase metade (40%) disse que a aconselhava, mesmo sendo ilegal. Nesse mesmo ano, a Organização Mundial de Saúde reconheceu a maconha natural como medicamento.

No caso da AIDS, o efeito mais importante é o de estimular o apetite. Pacientes de AIDS perdem em média 4 quilos por mês e podem morrer de desnutrição. O desejo de comer vem com a ajuda do THC. Alguns recorrem às cápsulas e outros aos cigarros, que continuam proibidos na maioria dos países. E a ilegalidade da maconha natural - para fumar - é um problema, porque grande número de médicos acha que ela é bem mais eficiente que a sua irmã artificial. Claro, isso não significa que ela seja indispensável. Mesmo porque há outros medicamentos disponíveis. Um exemplo, no caso do câncer, é a substância Odonsetron, muito receitada. Em comparação, o Marinol tem eficiência apenas moderada, diz o oncologista brasileiro Sérgio Simon. Outro problema é que nem todos toleram os efeitos não-medicinais do THC. São comuns os acessos de riso, moleza no corpo ou boca seca. Com tudo isso, quem resumiu bem a questão foi o professor de farmacologia Roberto Frussa Filho, da Universidade Federal Paulista/Escola Paulista de Medicina. “A maconha funciona”, disse ele à SUPER. “O que precisamos é avaliar se e quando vale a pena usá-la. Acho que pode se tornar uma opção para quem não aceita o tratamento convencional”.

No decorrer dos anos 90 o estudo científico da maconha avançou muito, apesar de vários contratempos importantes. O maior deles foi criado pelo governo estadunidense na tentativa de dar mais força à campanha antidroga. Em 1992, por exemplo, os EUA cortaram um importante programa federal de pesquisas sobre o valor terapêutico da planta, tirando recursos valiosos dos cientistas. Também suspenderam as autorizações especiais para que alguns pacientes usassem cigarros, complicando o desenvolvimento das terapias. As autorizações, até certo ponto, contornavam o problema da ilegalidade. Que são muitos, como lembra o brasileiro André Vilela Lomar, infectologista do Hospital Albert Einstein, de São Paulo. Ele explica a situação em que estão os pacientes de AIDS que aceitam bem o cigarro de maconha como estimulante de apetite: “Apesar disso, não recomendo. Justamente porque a maconha é ilícita, não se pode ter controle sobre a sua procedência, saber se está misturada a um mato ou se contém algum fungo”. No Brasil, a questão da legalidade atinge até o Marinol (comercializado nos Estados Unidos desde 1985), que utiliza o THC sintético. De acordo com o farmacologista Elisaldo Carlini, secretário nacional da Vigilância Sanitária, está sendo avaliada pelo Ministério da Saúde a possibilidade de liberar o uso do remédio. Carlini fez o anúncio há cerca de três meses.

Mesmo com todos os obstáculos, esta década trouxe muitas novidades sobre a Cannabis. A mais sensacional foi a descoberta dos locais em que ela age, no cérebro. Isso é importante porque a planta contém cerca de sessenta substâncias, chamadas coletivamente de canabinóides. Elas são as responsáveis pelos efeitos da planta no corpo mas não se sabia exatamente como cada uma delas atua no organismo. Então, em 1991, descobriu-se que as células do cérebro têm uma substância, ainda sem nome, cuja função é reagir quimicamente com os canabinóides. Ou seja, é por meio dela que os canabinóides afetam o cérebro e, a partir daí, o resto do organismo. Substâncias desse tipo são denominadas “receptores” pelos cientistas. A receptora dos canabinóides foi identificada em 1991 por duas equipes de cientistas nos Estados Unidos, uma da Universidade de Saint Louis e outra do Instituto Nacional de Saúde. Desde então, uma busca cuidadosa revelou quais são as regiões do cérebro mais ricas em receptores. O mapa dos receptores já revelou pistas interessantes. Ele mostra que os compostos da planta atuam em regiões cerebrais relacionadas com a memória, com os sentidos, com a capacidade de aprender e com os movimentos do corpo, inclusive a sensação de equilíbrio. E a maconha realmente afeta a memória, os sentidos, o aprendizado e o equilíbrio.

Na prática, porém, ainda há muito que conhecer. Os próprios efeitos da maconha ainda são incertos e podem ser contraditórios, como explica o farmacologista Isaltino Marcelo Conceição, do Instituto Butantã. “O THC é um depressor, mas quando a maconha é consumida em grupo costuma trazer euforia”. De acordo com o farmacologista Frussa Filho, é difícil comprovar os efeitos porque os estudos clínicos - nos quais se acompanha de perto o comportamento de um usuário - ainda são muito poucos. Também atrapalha o fato de a maconha ser usada, freqüentemente, em combinação com o álcool e com o tabaco. Por último, o entrave que parece ser o dilema decisivo atualmente: o da ilegalidade da droga.

Como separar a maconha que pode curar daquela que está misturada às mazelas sociais do vício e do tráfico? Quando for possível dar uma resposta a essa questão, vai ficar mais fácil conhecer melhor as suas virtudes e os seus defeitos. A Cannabis está conquistando uma fatia dos negócios convencionais. Plantada em fazendas especiais, autorizadas pelo governo de alguns países, ela se transformou em uma fonte surpreendente de matérias-primas, com as quais se produzem desde cosméticos até papel, roupas e alimentos. Um bom exemplo desses produtos vai estar nos seus próprios pés em breve. Depois de um ano de testes, a Adidas está lançando, em todo o mundo, um novo modelo de tênis para passeio. Trata-se do Chronic, que, na gíria americana, significa fumante de maconha. Feito de cânhamo, a fibra que se encontra no caule e nos galhos mais robustos da planta de maconha, o Chronic tem um ínfimo teor de THC. “Estamos vendendo um conceito ecológico”, diz Marta Maddalena, gerente de produto da Adidas do Brasil, que vai importar o calçado. “Essa fibra não passa por processos químicos, não danifica o meio ambiente e tem uma cara rústica. É como arroz integral.”

A idéia, sem dúvida, é boa. O mundo inteiro anda atrás de materiais alternativos. Em 1993, a Inglaterra colheu sua primeira safra de Cannabis inteiramente legal, plantada em 30 locais do país. As fazendas são subsidiadas pelo Fundo Agrícola da Comunidade Européia. Foram 7500 toneladas de cânhamo, aproveitadas, entre outras coisas, na produção de papel. Resultado: desde os tradicionais saquinhos de chá e até formulários da justiça britânica são hoje produzidos a partir do arbusto. A França também pediu e obteve apoio da Comunidade Européia baseando-se em argumentos econômicos e ecológicos para fazer papel. Afinal, a Cannabis rende quatro vezes mais do que o eucalipto, com a vantagem de ter menos lignina, substância nociva ao meio ambiente. Itália e Espanha também estão processando fibras para fazer papel do mesmo jeito. Com muito mais motivo, os europeus passaram para os tecidos, cuja afinidade com o cânhamo vem de muitos séculos. No Egito dos faraós, ele era usado em cordas e velas de embarcações. No mundo moderno, ele está virando os hemp jeans (em inglês, hemp significa cânhamo). A fibra está sendo aproveitada ainda em pranchas de esquiar na neve, as snowboards. Na Suíça, a idéia foi transformar as folhas em xampus e cremes faciais. Tanto na Europa como nos Estados Unidos, se utilizam as sementes para obter prateleiras inteiras de supermercado: detergentes, fertilizantes, diversos óleos, molhos comestíveis e queijo vegetal.

Fonte: Superinteressante nº 8, agosto de 1995.

quarta-feira, 1 de abril de 1998

A Veja da maconha

Abril de 1998, Trip nº 49

Sucesso editorial, a revista High Times, que se dedica à "Cannabis culture", merece uma tese. Em entrevista exclusiva, seus editores Steven Hager e Peter Gorman falam como se impõem no mercado de publicações americano, defendendo o uso consciente da erva e denunciando a politicagem que envolve sua legalização.


Steven Hager


Peter Gorman

Vavá Ribeiro e Fábio Massari

A revista norte-americana High Times - bíblia dos maconheiros convictos - foi fundada em 1974 por um visionário (anti)herói da contracultura chamado Gary Goodson, mais conhecido como Tom Forcade, ou Thomas "King" Forcade, ou Reverendo Forcade, para os íntimos. A máxima "live fast die young" caiu como uma luva para o alucinado Forcade. Sua vida foi uma aventura cinematográfica em fast-forward, um grande delírio protopsicodélico, com gigantescas bad trips. Meteu-se com os Sex Pistols e com Woodstock; uniu o "underground" americano através do seu Underground Press Syndicate; liderou os "yuppies", fundou os "zippies" e depois brigou com todo mundo; foi perseguido pela CIA e FBI; provocou a morte de seu melhor amigo numa manobra ilegal espetacular e… se suicidou aos 33 anos.

A história da High Times é pontuada por momentos razoavelmente distintos. O período de 1974 a 1978 representa os momentos mágicos de surgimento e estabelecimento de um canal para a cultura da maconha, agindo como agente catalisador de atitudes contraculturais, que viriam a definir posturas com relação a todo establishment rançoso que se intrometesse no caminho.


Setembro de 1977:
Um patrimônio jornalístico norte-americano. O homem do "gonzo" (matriz do texto praticado por muitos da revista), abre o bico: É o fora-da-lei-mor Dr. Hunter S. Thompson.

Segundo Hager, "a revista perdeu seu foco depois da morte de Tom". No período que vai do finalzinho dos anos 1970 até 1983, a High Times viveu de festas, de atmosfera selvagem, com a cocaína dominando a cena. Foi aí que a revista perdeu público, só recuperado com a eliminação total do pó e com a volta às origens editoriais políticas, com ênfase no aspecto social da cultura da maconha e destaque para o cultivo. "Ao invés de lidar com o traficante, incentivamos o público a plantar sua própria maconha. Isso deu nova vida à revista", ensina Hager.


Novembro de 1980:
Os delírios sonoros do fundador Tom Forcade partem para a briga. O tiozinho doidão da tradição americana, Willie Nelson; o escrotinho doidão da antitradição britânica Johnny Rotten, e o antológico título: "Essa capa não é grande o suficiente para nós dois".

No final dos anos 1980, a High Times impõe novos ritmos às tribos devotas à maconha, instaurando definitivamente o "hemp moviment". De lá para cá, não parou de crescer nos EUA e no mundo, conquistando a cada dia aliados importantes na briga contra uma "situação intolerável", como definem os editores.


Fevereiro de 1989:
Uma das várias capas de outro doutor da família High Times, o Dr. Trips, Jerry Garcia. Numa das chamadas, uma pérola: "Fumamos bananas com David Peel". O David "Casca" é mais um dos heróis "cult" da contracultura americana, que em 68 lançou com a banda Lower East Side o dope classic Have a Marijuana, de onde saiu a música-hino I Like Marijuana. Em 1972, John Lennon produziu um disco de Peel chamado The Pope Smokes Dope (Peel está vivo e continua doidão).

A High Times ultrapassa a barreira dos 20 anos de atividade em plena forma. A idéia de que a revista é puramente panfletária é um estigma que não incomoda mais seus responsáveis, nem seu público. Afinal, as tão faladas cotações do mercado da maconha que a revista apresenta a cada edição, e as deliciosas e proibidas receitas de comida à base da erva não passam de meros coadjuvantes numa estrutura editorial muito mais rica, instigante, perigosa.


Agosto de 1995:
Uma das melhores de todos os tempos. Um alienígena com um baseado. Nos olhos do ET, os campos de erva. "Leve-me ao seu 'dealer'".

Por trás do tratamento de superstar concedido à planta, a High Times joga com lances jornalísticos de fazer inveja, de fortes implicações sociais, políticas e culturais. Do acompanhamento das ações oficiais e ilegais no processo de desenvolvimento das técnicas de plantio, tratamento industrial e uso médico da maconha às mais delirantes incursões filosóficas, religiosas e espirituais, passando por denúncias complexas, High Times acontece.

O homem da Cannabis

Editor da revista mais odiada pelo FBI e CIA - a High Times, especializada na cultura Cannabis -, Steven Hager, 44 anos, é uma das cabeças mais polêmicas da imprensa norte-americana. Ele articula (e imprime) um jornalismo que mescla doses de hedonismo, aventura, verdade e informação, no estilo "doa a quem doer". Híbrido de Lou Reed e Tom Wolfe, Hager é o maior responsável por perpetuar o sucesso editorial da High Times. Em entrevista exclusiva, Hager recrimina a imprensa norte-americana e acusa o governo Clinton de tráfico de drogas.

Trip - Como a High Times entrou em sua vida?

Steven Hager - Um amigo me convidou para ajudar na revista. Depois que Tom morreu, a revista perdeu o foco original, virou um fanzine de festa, com muita cocaína e drogas pesadas. Eu entrei há dez anos para buscar as bases originais. Uma revista política, que defendesse as aspirações e objetivos da cultura Cannabis, incentivando a filosofia de plantio próprio.

Trip - Qual o perfil do leitor da High Times?

Steven Hager - Existem basicamente dois: os velhos hippies Jerry Garcia e a nova geração de rave, ciber punks. Somos muito populares na faixa dos 19, 20 anos.

Trip - Como funciona uma revista nos Estados Unidos, divulgando e incentivando o uso de drogas ilegais?

Steven Hager - O governo não gosta de nós. Já tentaram nos desativar. Mas temos o direito constitucional de imprimir a informação. A liberdade de imprensa na América é protegida e nós não concordamos com a política adotada pelo governo a respeito da Cannabis. Nós acreditamos que é a planta ecologicamente mais eficiente do planeta. Mas o governo não acha isso. Não tem meio termo: ou estamos certos ou eles estão.

Trip - Vocês têm algum interesse no Brasil?

Steven Hager - Yeah, a gente sempre manda um repórter se infiltrar pela América do Sul. Peter Gorman está sempre lá.

Trip - Se vocês tivessem um canal na TV norte-americana, que tipo de programação ou informação vocês passariam?

Steven Hager - Poríamos a verdade sobre a guerra contra as drogas. O governo conspira para vender drogas pesadas e a CIA é envolvida com o tráfico de heroína e cocaína. Ao mesmo tempo, o governo sabe a verdade sobre a Cannabis, que é a melhor medicina para a glaucomia, asma, AIDS, câncer, escleroses, dor de cabeça… Eles sabem disso, mas tentam esconder do povo. Basicamente, a situação é: o governo quer prender, perseguir pessoas doentes, se recusa a aceitar o uso industrial, farmacêutico, religioso e o direito espiritual. Isso tem que mudar.

Trip - Qual seria a principal corporação contra a legalização da maconha?

Steven Hager - Com certeza, a indústria farmacêutica. É um mercado de bilhões de dólares. Medicina e farmacêuticos não deveriam ser fontes industriais voltadas ao lucro. Em outras palavras, elas tiram o dinheiro de pessoas doentes com a finalidade de capitalizar bilhões de dólares. Nós deveríamos cuidar dos doentes, ricos ou pobres. Sendo assim, eles controlam todas as patentes de drogas sintéticas, se opondo a qualquer tipo de medicina natural.

Trip - Qual a linha de jornalismo que a High Times busca?

Steven Hager - Basicamente, o bom, a verdade, algo que acrescente ao povo. Qualquer coisa longe do jabá sobre as celebridades que a maioria das revistas americanas faz. O jornalismo é decadente nos Estados Unidos; 90% do foco é voltado para fofocas sobre estrelas do cinema e etc. Isso não nos interessa enquanto a CIA está matando e mentindo para o povo.

Trip - Quais são os pré-requisitos necessários no currículo para trabalhar na High Times?

Steven Hager - Alguém que saiba escrever honestamente, pesquisar a fundo e juntar as peças para uma história interessante. Não existem muitos jornalistas interessados em trabalhar para a cultura Cannabis porque não existe muita grana, nem futuro. Ninguém fica rico escrevendo sobre a corrupção do governo nos Estados Unidos. Pelo contrário, se você quiser fazer grana como jornalista, você tem que escrever sobre celebridades.

Trip - Em uma das capas, no passado, vocês colocaram o ex-presidente Jimmy Carter com uma colher de cocaína no nariz. Vocês acreditavam, na época, na ligação do governo americano com o Cartel de Medellin?

Steven Hager - Não, mas havia pessoas no staff de Jimmy Carter que usavam muita cocaína. Ele, pessoalmente, não usava. Foi uma das melhores capas que a revista já publicou, mas não foi justo com Jimmy Carter.

Trip - Vocês se meteram em encrenca por causa disso?

Steven Hager - O que ocorreu é que Jimmy Carter era a favor da legalização da maconha. Depois do fato, ele mudou de política, o que, na minha opinião, atrapalhou todo o processo de legalização.

Trip - E se Clinton estivesse na capa do próximo número? Qual seria a chamada?

Steven Hager - Clinton é um político incrivelmente corrupto. Se fôssemos falar alguma coisa sobre ele, não seria nada bom. Acho que ele tem conexões com o aeroporto de Arkansas, onde entra cocaína e saem armas. Ele era o governador de Arkansas na época e, certamente, ele sabia o que se passava naquele aeroporto.

Trip - E essa história dele fumar, mas não tragar?

Steven Hager - Acho que ele já fumou muito.

Trip - Como vocês conseguem tantas informações confidenciais sobre atividades ilegais do governo?

Steven Hager – É bem fácil. É só seguir a trilha do dinheiro. Vários livros já foram escritos sobre o envolvimento da CIA com o tráfico de drogas. Uma vez, o tenente-coronel Bough Rytz, astro da guerra do Vietnã, reuniu-se com Cuntah, que era o senhor da Guerra do Ópio, na Birmânia, e gravou um vídeo com Cuntah declarando que Richard Armatage - na época assistente pessoal de George Bush - era seu maior comprador de heroína. Bough Rytz filmou e mostrou o vídeo em frente ao Congresso e, três dias depois, foi preso. Em vez de prenderem Armatage e revelarem ao público toda a trama, eles prenderam o cara que tentou mostrar a verdade. Este é o ponto. O difícil não é descobrir o que acontece, mas sim conseguir justiça.

Trip - Vocês têm diversos contatos e conhecem bem traficantes e conexões. O que impressiona é como vocês não sofrem atentados e pressões políticas do governo!

Steven Hager - Porque, no passado, nunca funcionou. E pior: nos dá publicidade. Quando eles nos prendem, nós berramos e o resto da imprensa se sente ameaçada e nos protege. O que eles tentam é nos ignorar e rezar para nós sumirmos. Mas isso não acontecerá.

Trip - O que você espera para o futuro da situação da Cannabis?

Steven Hager - Gostaria que fosse legalizada, que as pessoas tomassem consciência que gera benefícios econômicos, ecológicos, medicinais e espirituais para todos.

Trip - Qual seria o maior passo a ser dado para a legalização?

Steven Hager - Temos que provar economicamente que o Hemp é a solução e traz lucro. Na hora em que Wall Street vir o dinheiro que se pode lucrar, eles vão querer a legalização.

Trip – Você tem algum conselho para as organizações em prol da legalização no Brasil?

Steven Hager - Continuem a provar que é uma solução inteligente e ecológica. Use com responsabilidade, pois quanto mais você fuma, menos você obtém da planta. Se você fumar o dia todo, não estará se beneficiando. Se você não tem um motivo médico para fumar o tempo todo, não o faça. Nós temos que ensinar as pessoas a usarem a Cannabis de uma maneira inteligente.

Fonte: Revista Trip nº 49 (Abril de 1998)
http://www2.uol.com.br/trip/49/maconha/home.htm

quarta-feira, 25 de março de 1998

Descriminalização, prevenção e cura

25 de março de 1998, ISTOÉ

A juíza carioca da Justiça Militar, Maria Lúcia Karam, 48 anos, esteve em São Paulo para participar da 9ª Conferência Internacional sobre a Redução de Danos Causados pelas Drogas. Tem como credenciais treze anos de atuação em Varas Criminais e da Família no Rio de Janeiro. Defende a total descriminalização do porte, uso e comércio de drogas. Na quinta-feira, 19, falou com ISTOÉ:

ISTOÉ – Por que a senhora defende a descriminalização das drogas?

Maria Lúcia – A proibição do consumo fere o princípio constitucional da liberdade individual. A liberdade individual implica o próprio direito de uma pessoa fazer mal a si mesma.

ISTOÉ – Um adolescente de 13 anos que use drogas sabe o que é autodestrutivo ou não para ele?

Maria Lúcia – Sim.

ISTOÉ – A proibição é o melhor controle?

Maria Lúcia – É um controle perverso. A ilegalidade traz violência e corrupção.

ISTOÉ – Se liberar, como seria a comercialização?

Maria Lúcia – Regulada pelo mercado e sujeita à livre concorrência. A quantidade e os locais de venda é que teriam de ser limitados, e a propaganda, proibida. Isso já deveria acontecer com o álcool e o tabaco. O Ronaldinho anunciando “a número um” não dá, né?

ISTOÉ – A descriminação vale para maconha, cocaína, crack, heroína, etc.?

Maria Lúcia – Todas devem ser liberadas porque o problema não é a droga em si, mas a relação do indivíduo com ela. Pode-se usar drogas recreativamente ou não.

ISTOÉ – A senhora não acha que a questão das drogas extrapola o controle sobre o próprio corpo?

Maria Lúcia – Descontrolar-se faz parte da liberdade. Só que se o descontrole faz alguém buscar as drogas, esse alguém deve ser tratado. Não adianta prender ou internar. Tem de tratar a origem do descontrole.

Um kit básico com seringa descartável, água destilada, hipoclorito de sódio (água sanitária), algodão embebido em água e recipiente para diluição vai ser distribuído a usuários de drogas injetáveis do Estado de São Paulo num programa de prevenção à AIDS. Isso garante material esterilizado, sem o risco de contaminação. A nova lei foi regulamentada no sábado, 14, um dia antes da abertura da conferência da qual Maria Lúcia participou juntamente com 800 especialistas de 50 países. O custo para o Estado de um dependente dentro de um programa de troca de seringas é de US$ 150 por ano. Um doente de AIDS custa entre US$ 12 mil e US$ 25 mil anualmente.

Wilson Roberto Gonzaga da Costa (diplomado pela Universidade de São Paulo) é psiquiatra há duas décadas. Ele acredita que o chá de ayahuasca, popularizado pela seita do Santo Daime, ajuda o dependente a livrar-se das drogas. Costa tomou contato com o chá há 16 anos e desde então o toma regularmente, sempre num contexto ritualístico. Afirma que nesses anos viu muitas pessoas mudarem suas vidas devido ao uso do chá e acredita que ele tem o "poder de cura". Na última semana o Conselho Federal de Medicina ameaçou cassar o registro de Costa caso fossem confirmadas as notícias de que ele estaria usando o Daime para tratar mendigos do centro de São Paulo. "Apenas faço um trabalho social com mendigos do bairro de Santa Cecília. Não se trata de um tratamento", diz ele.

ISTOÉ – O Daime cura dependentes?

Wilson Costa – Cura. Não tenho dúvidas sobre isso. No Peru existe um centro de tratamento de usuários de drogas que utiliza o chá de ayahuasca com essa finalidade.

ISTOÉ – No Brasil o chá só é liberado para uso religioso. O senhor está tratando dependentes com o chá?

Wilson Costa – Eu não estou fazendo um tratamento. O chá não pode ser usado fora de um contexto ritualístico. E eu sou um médico e respeito os princípios éticos da minha profissão.

Fonte: http://www.terra.com.br/istoe/semana/148610f.htm

quarta-feira, 25 de fevereiro de 1998

Dos males, o menor

25 de fevereiro de 1998, ISTOÉ

Relatório censurado pela OMS afirma que a maconha é menos prejudicial do que o tabaco e o álcool.

Carla Gullo e Peter Moon
Colaboraram: Rachel Mello (DF), Francisco Alves Filho e Paulo César Teixeira (RJ), Bruno Weis, Ivan Padilla, Luísa Alcalde, Luiza Villaméa, Marta Góes, Norton Godoy, Roberto Comodo, Patrícia Andrade e Rita Moraes (SP).

A Organização Mundial da Saúde (OMS), em Genebra, pediu, em 1992, aos médicos do seu Programa de Abuso de Substâncias (PSA), que elaborassem o mais completo relatório sobre o consumo e os efeitos médicos e psicológicos da maconha. O objetivo era produzir a palavra final sobre o assunto. Para escrevê-lo, encomendaram relatórios a 50 especialistas de todo o mundo, entre eles farmacologistas, psiquiatras, químicos, pneumologistas e cardiologistas. Um documento deveria fazer um raio-x completo da planta Cannabis sativa, o cânhamo, estabelecendo até o último detalhe tudo o que a ciência conhece sobre sua composição química e seu principal princípio ativo, o THC (tetrahidrocanabinol), responsável pela sensação de prazer dos consumidores. Foi feito um minucioso levantamento para cada aspecto dos efeitos da droga sobre o organismo: sua influência sobre o batimento cardíaco e o fluxo sanguíneo, o modo como afeta os pulmões e as vias respiratórias, os sintomas mais agudos experimentados pelos usuários e os efeitos psicológicos decorrentes do uso prolongado. Um dos relatórios, escrito pelos médicos canadenses Robin Room e Susan Bondy, do Instituto de Pesquisa do Vício, de Toronto, estabeleceu comparações entre o consumo de maconha com o do álcool, do tabaco e da heroína. O trabalho ficou pronto em 1995, tinha 15 capítulos e circulou pelas mãos de 50 autoridades da OMS, de diversas agências das Nações Unidas e do Instituto Nacional de Abuso de Drogas (Nida) dos Estados Unidos. Da leitura desses especialistas vieram sugestões para a condensação dos capítulos num relatório final, tarefa que coube aos cinco membros do Programa de Abuso de Substâncias – entre eles, a médica paulista Maristela Monteiro, 37 anos. Em dezembro do ano passado, a OMS finalmente editou seu mais amplo estudo sobre a maconha. É um livro de 49 páginas, intitulado Cannabis: uma perspectiva de saúde e agenda de pesquisas.

Na quarta-feira 18, no entanto, a revista científica britânica NewScientist estampou em sua reportagem de capa a informação de que o capítulo que comparava os efeitos da maconha aos do álcool, tabaco e heroína foi suprimido pela OMS. Segundo a publicação, a decisão de retirar o estudo comparativo havia sido feita por pressão do governo americano e de dirigentes do Programa Internacional de Controle de Drogas da ONU. O motivo: o trabalho informava que fumar maconha causa muito menos mal à saúde do que o cigarro ou o álcool. Temia-se que esse argumento servisse de munição às organizações que defendem a descriminalização da droga. Billy Martin, da Faculdade de Medicina da Virgínia e um dos 50 especialistas envolvidos no trabalho, disse à revista inglesa que os dirigentes da OMS "ficaram malucos" ao ler a pesquisa comparativa entre maconha, álcool e cigarro.

Em nota oficial divulgada na quinta-feira 19, a OMS repudia a reportagem e afirma que a exclusão do texto nada teve a ver com pressão política. "A alegação da NewScientist não tem base nenhuma", afirmou a doutora Maristela Monteiro a ISTOÉ, de seu escritório em Genebra. "Não estamos segurando informação. Não houve pressão dos americanos. O texto não levava a nada, era tendencioso e ia embolar o meio de campo." Os originais, de 41 páginas, dos médicos canadenses Room e Bondy chamavam-se Uma avaliação comparativa das conseqüências psicológicas e de saúde da Cannabis, do álcool, da nicotina e dos opiáceos. Eles acreditavam que seu trabalho seria condensado e incluído no livro da OMS, mas não foram sequer avisados da supressão. "Ninguém me comunicou nada quando resolveram tirar a nossa contribuição", disse Robin Room a ISTOÉ de seu escritório em Toronto. Formada pela Escola Paulista de Medicina com doutorado em Psicofarmacologia, Maristela está há quatro anos na OMS. Ela assegura que as conclusões dos canadenses foram excluídas a partir de uma decisão científica e forneceu a ISTOÉ dois trechos do material cortado para exemplificar o que diz. Na página 21, lê-se que, "baseado nos padrões existentes de consumo, a Cannabis impõe muito menos problemas sérios de saúde pública do que os impostos pelo álcool e pelo tabaco nas sociedades ocidentais". O problema, para Maristela, é que mais adiante eles ignoram esta diferença entre os poucos consumidores de maconha e os muitos fumantes e generalizam sua conclusão. Os autores afirmam "existir boas razões para dizer ser improvável que o uso rivalize com os riscos de saúde pública impostos pelo álcool e pelo tabaco, mesmo se tantas pessoas usassem Cannabis quanto as que hoje bebem álcool e fumam tabaco." Esta imprecisão ajudou a OMS a desconsiderar as conclusões da dupla.

"Não há contradições nem ausência de base científica em nosso trabalho como alega Maristela Monteiro. Tanto que em julho o Instituto de Pesquisa do Vício e a OMS vão publicar o mesmo trabalho concluindo que a Cannabis provoca danos muito menores do que o cigarro ou a bebida", rebate Room. Mas, além de uma discussão sobre a maconha e os programas de saúde pública, o que efetivamente existe no estudo dos canadenses? Uma das polêmicas conclusões, por exemplo, afirma que, nas sociedades mais desenvolvidas, a maconha parece ter pouca influência no aumento da violência, ao contrário do álcool. Também assegura que, apesar das evidências de que o uso de maconha durante a gravidez acarrete perda de peso nos recém-nascidos, os dados à disposição estão muito longe de ser conclusivos. A Cannabis saiu-se melhor que o álcool e o cigarro em cinco dos sete testes comparativos de danos em longo prazo à saúde. O relatório diz que o consumo pesado de fumo, maconha e bebida pode levar à dependência, mas que somente o álcool causa a chamada síndrome de abstinência. E enquanto o consumo freqüente de bebida alcoólica leva à cirrose, severos danos cerebrais e um grande aumento dos riscos de acidente e suicídio, o texto conclui que são fracas as provas de que o uso crônico de maconha produza alterações no raciocínio, na memória e na capacidade de aprendizado. "Baseado em que se pode comparar o fumo de um cigarro de maconha com o consumo de um drinque? Não existe evidência nenhuma para isso", contesta Maristela. Segundo ela, o trabalho censurado chegava a afirmar que o viciado em heroína pode morrer de overdose, mas que a maconha nunca matou ninguém. "É dizer o óbvio. Gostaria de saber: o que é uma overdose de maconha?"

Para quem acompanha o debate, esta seria a segunda vez que a OMS manipula esse tipo de informação. "Em 1997, esconderam a conclusão de que não há relação entre o consumo de maconha e o câncer", acusa o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ). "Se isso não for esclarecido, vai ficar exposta à contradição: como uma substância que é menos nociva que o álcool e o tabaco pode ter um tratamento jurídico mais rigoroso?" Oded Grajew, presidente da Fundação Abrinq para os Direitos da Criança concorda com Gabeira. "Nesse estudo ninguém está dizendo que a maconha faz bem, mas que faz menos mal que os outros", diz. "O que importa é que a bebida e o cigarro têm empresas constituídas, são aceitas porque fazem prevalecer seus interesses, ditam as regras."

Antes da publicação da OMS, o principal e mais longo estudo sobre a droga era do pneumologista Donald Tashkin, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, que nos últimos 15 anos acompanhou 130 usuários, comparando-os com grupos de pessoas que só fumam tabaco, fumam tabaco e maconha ou nenhum dos dois. Seus resultados parecem confirmar o estudo da OMS. A primeira constatação de sua pesquisa é de que tanto o cigarro quanto a maconha provocam danos semelhantes nas células do aparelho respiratório. Enquanto tabagistas fumam 20 ou mais cigarros ao dia, dificilmente um usuário de maconha fuma mais de quatro baseados no mesmo período. Apesar disso, tossem e pigarreiam tanto quanto os tabagistas. Nos dois grupos, um em cada cinco usuários tem bronquite. A razão é que os baseados não têm filtro e seus usuários tragam muito mais profundamente, mantendo a fumaça nos pulmões por um tempo até quatro vezes mais longo que os tabagistas. "Isso resulta num acúmulo 40% maior de alcatrão nos alvéolos pulmonares", diz o médico americano.

Tashkin fez uma descoberta intrigante. Apesar de provocar danos às células, a maconha não afeta a capacidade respiratória nem provoca enfisema, mesmo entre os mais compulsivos usuários. A prática clínica endossa os estudos que apontam a droga como um mal menor. O sanitarista Fábio Mesquita, membro do Conselho Estadual de Entorpecentes do Estado de São Paulo, afirma que os efeitos nocivos da Cannabis são inferiores aos das drogas legais. "O cigarro é responsável por problemas como câncer de pulmão, de garganta, de boca, acidentes vasculares e infarto", afirma Mesquita. "Os problemas que a maconha causa são poucos. Um deles é indireto. A falta de percepção do tempo e do espaço pode eventualmente causar acidente de carro." A NewScientist relata, por exemplo, que a polícia inglesa constatou que um de cada dez motoristas responsáveis por acidentes de trânsito havia testado positivo em relação à maconha. O problema é que a maioria também havia bebido e em nenhum momento é possível garantir que o fato de o teste ser positivo implique dizer que o motorista estava sob efeito da droga. Isso pelo fato de o teste identificar traços de maconha mesmo muito tempo depois de o efeito dela ter passado.

No Brasil, Mesquita e um grupo de especialistas estão tentando colocar a maconha novamente na lista de drogas legais. Ela tornou-se ilegal a partir de 1938 e a todo o momento cria-se uma polêmica em torno de sua descriminalização. "A maconha não pode mais ser vista como um demônio. A verdade é que todas as drogas podem fazer mal. Tudo depende de como e quanto se usa", conclui Mesquita. Algumas pessoas, a despeito do que se imagina, podem até se tornar dependentes da maconha. "Muita gente usa e não fica dependente. Mas alguns pacientes têm até que ser internados para se livrar da droga", conta o psiquiatra Arthur Guerra de Andrade, do Grupo de Estudos de Álcool e Drogas do Hospital das Clínicas de São Paulo. Foi o caso do estudante Marcelo Mendes, 22 anos. "Comecei a fumar aos 19 anos. Não trabalhava nem estudava e tinha o tempo todo para a droga", conta ele. Essa disponibilidade o levou a consumir vários cigarros por dia, o que acentuou sua apatia e o ajudou a ficar longe dos estudos. "Eu tinha tanto THC no corpo que nem barato eu sentia mais." Para piorar a situação, Marcelo foi pego pela polícia com 25 gramas de maconha no bolso. Fichado, ele finalmente pediu ajuda aos pais, que resolveram interná-lo. "Fiquei três semanas lá. Eu era o único na clínica dependente de maconha. Mas estava precisando", diz. Marcelo está há um mês sem fumar e retomou os estudos. Como ele, muitos usuários da Cannabis se tornam apáticos, o que para alguns médicos é um dos pontos críticos da droga. "Ela tira o tesão pela vida. Quem fuma muito fica sem motivação para nada. É o efeito Scarlett O’Hara, de …E o vento levou. Fica tudo para amanhã", compara o psiquiatra mineiro Arnaldo Madruga, especialista no tratamento de dependentes químicos.

O uso crônico da droga pode, em princípio, causar outros tipos de problemas. As folhas da maconha contêm uma cera que possui substâncias irritantes e cancerígenas (como acontece com o tabaco). "Usada em excesso, a planta causaria câncer de pulmão. Mas não há provas disso", diz o psicofarmacologista Elisaldo Carlini, membro do Painel de Perícia da OMS. Outro efeito da Cannabis: ela altera as taxas do hormônio testosterona e provoca uma diminuição no número de espermatozóides. "O homem se torna infértil, mas o problema se reverte com a suspensão da droga", afirma Carlini. Por fim, a maconha interfere na memória de curto prazo. O usuário tem dificuldades em fixar informações novas e recentes.

Apesar de os danos para a saúde não serem tão gritantes, a maconha costuma ser malvista pela sociedade por se acreditar que seria o primeiro degrau na escalada para drogas mais pesadas, como o crack e a cocaína. Muitos especialistas, entretanto, não estão de acordo com essa teoria. "A experiência é um fator individual. A primeira droga que se experimenta não tem nada a ver com aquela que eventualmente a pessoa vai usar", afirma Carlini. Um estudo liderado pelos psiquiatras Dartiu Xavier da Silveira e Eliseu Labigalini, do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo, mostrou que muitas vezes a maconha pode ajudar a fazer o caminho contrário. Ou seja, ser um meio para sair da dependência de drogas pesadas. "Começamos a observar pacientes que conseguiam ficar abstêmios de crack e cocaína quando passavam a fumar maconha. Isso diminuía consideravelmente as recaídas, muito comuns no dependente químico", conta Silveira. Os psiquiatras passaram a estudar 20 pacientes e comprovaram a tese: 70% dos usuários de crack e cocaína pararam com essas drogas depois de usar maconha e todos, em seguida, abandonaram a Cannabis. Seria o chamado efeito trampolim ao contrário. "É um novo recurso terapêutico. Não é nenhum sacrilégio se colocar uma droga para sair de outra, mais pesada. Nos países desenvolvidos, como a França, isso já é comum", afirma Silveira.

O uso medicinal da erva é conhecido há milênios. O primeiro registro na história foi encontrado num livro chinês de farmacologia, de 2730 a.C. Era prescrita como remédio eficaz contra "debilidade feminina, reumatismo e apatia e também para cicatrizar feridas, infecções na pele e problemas no sistema nervoso". As sementes, em infusão, eram usadas para combater vermes. O óleo era indicado contra caspa e o suco das folhas aplicado contra picadas de aranhas e escorpiões. No século passado, a Europa adotou alguns efeitos terapêuticos da erva e ela passou a fazer parte da farmacologia inglesa. Com a ilegalidade, entretanto, o uso medicinal ficou esquecido, só vindo a ser recuperado em 1960. Hoje, medicamentos à base de THC são usados em alguns países para amenizar náuseas e vômitos de pacientes com câncer submetidos à quimioterapia. "Também ajudam a diminuir esses sintomas em pacientes com AIDS, além de melhorar seu apetite", afirma Elisaldo Carlini. Nos casos de glaucoma (problema de pressão alta nos olhos que pode acarretar em perda da visão), um colírio à base de THC é capaz de controlar o problema. O debate gerado pela censura ao trabalho dos médicos canadenses deve levar a OMS a aprofundar os estudos em torno da maconha. Mas já se pode extrair uma conclusão. Os trabalhos preliminares e a experiência médica têm revelado que é possível obter benefícios farmacológicos de uma droga que, até há bem pouco tempo, era vista exclusivamente como um problema social ou de polícia.

Verdades e mentiras

VERDADES:

● Reprimir não reduz o consumo. Legalizado em 1976, na Holanda, o consumo cresceu de 3% para 12% em 1991. Nos Estados Unidos, a repressão aumentou e o consumo subiu muito mais. Chegou a 50% dos alunos de segundo grau.

● Maconha pode causar câncer de pulmão. Alguns estudos sustentam que a maconha mais do que a nicotina pode iniciar alterações cancerígenas em células do pulmão.

● Não prejudica o feto. Não há nenhuma comprovação de que o consumo materno de maconha faça mal ao feto, segundo a OMS.

● Não atrapalha a performance de esportistas. Atletas como jogadores de futebol que fumam até três cigarros de maconha por dia não apresentam nenhuma diferença de capacidade respiratória em relação aos que não fumam.

MENTIRAS:

● Maconha vicia mais do que cigarro e álcool. 90% das pessoas que usam maconha na juventude param de fumar por volta dos 30 anos. Quem experimenta cigarro e álcool continua a consumi-los por muito tempo ou por toda a vida.

● Destrói a atenção, a memória e a capacidade de aprender. As pesquisas mais recentes negam o clichê do maconheiro sonhador e distraído. Fumar ou não produz diferenças mínimas.

● É mais fácil parar de beber do que parar de fumar maconha. A abstinência de Cannabis pode gerar na pior das hipóteses insônia, ansiedade e sintomas semelhantes aos de um resfriado.

● Não existe maconha de laboratório mais forte e viciante. Pacientes que procuram centros de desintoxicação permitem observar que isso está de fato acontecendo.

Ratinho britânico

João Caminoto (de Londres).

O debate sobre a descriminalização da Cannabis volta e meia agita a agenda política da maioria dos países europeus. Na Grã-Bretanha, o tema vem recebendo um grande destaque desde setembro do ano passado, quando o The Independent on Sunday, a edição dominical de um dos jornais mais respeitados da ilha, decidiu iniciar uma campanha agressiva pela liberalização do consumo da droga. Num artigo ilustrado com uma enorme foto da folha de Cannabis, a editora-chefe do jornal fez uma apaixonada defesa da causa. "Eu enrolei o meu primeiro baseado num dia calorento do verão de 1968, quando estava no Hyde Park. Tinha apenas 17 anos", disse Rose Boycott, que atualmente também comanda o diário The Independent.

"A ironia é que uma das drogas mais perigosas do mundo, que é responsável pelo maior número de crimes, pelo maior número de horas perdidas no trabalho, pela maioria das rupturas familiares, que causa violência, desilusões, pode ser facilmente encontrada em qualquer supermercado ou lojinha da esquina. Se o álcool é um tigre, a maconha é um simples ratinho", escreveu Rose, que informou aos leitores ser uma ex-alcoólatra e que há muito tempo não fumava um baseado. "Será que não está na hora de encararmos os fatos e acabar com essa hipocrisia?"

Desde a publicação do famoso editorial, o jornal londrino passou a liderar a campanha pela descriminalização que antes era tocada apenas por algumas organizações sem grande expressão. Em dezembro passado, o jornal promoveu um seminário sobre Cannabis reunindo políticos, deputados, médicos, líderes religiosos e usuários da droga de diversas partes do mundo. Para reforçar a sua campanha, patrocinou uma pesquisa para saber o que os britânicos achavam do assunto. Cerca de 80% do público disse que a legislação deveria ser modificada. Quase a metade dos entrevistados defendeu a liberação da droga para uso médico e 35% quer a descriminalização para "uso recreativo". Outros jornais britânicos, ancorados na iniciativa do concorrente, começaram a abordar com mais freqüência o assunto.

A questão agora é saber se o estudo revelado para a revista New Scientist vai servir para reforçar a campanha pela descriminalização na Grã-Bretanha e em outros países. "Tomara que sim", disse a ISTOÉ o antropólogo Anthony Henman, um anglo-brasileiro que se dedica ao tema e que atualmente está realizando uma pesquisa sobre drogados em Nova York. Henman defende a legalização do consumo. "Está mais do que provado que proibições não são os instrumentos apropriados para se lidar com o assunto."

Arqueologia da repressão

Lu Gomes

A história registra períodos nos quais a Cannabis foi reprimida. O Santo Ofício baniu o consumo da maconha e outras ervas medicinais no século XII. Qualquer pessoa usando a Cannabis passou a ser perseguida por "bruxaria", entre elas santa Joana D’Arc, acusada em 1430 de usar uma variedade de ervas, incluindo a maconha, para "ouvir vozes". Mas nenhuma repressão teve a abrangência geográfica como a movida contra essa planta pela civilização contemporânea. Na década de 30, um desconhecido médico de Sergipe, Alexandre Ferreira, relacionou a maconha à prostituição, atribuindo à erva "a motivação para o comércio intersexual, pois sob seus efeitos as prostitutas se entregam ao deboche com furor e, sem fregueses ou parceiros, são capazes de praticar o amor lésbico, para satisfazer as exigências da droga".

Mas a ciência não foi a grande responsável pela repressão à maconha, a qual acabou incluída na Carta das Nações Unidas. Os EUA, país com maior poder de persuasão quando da criação da ONU, tiveram papel fundamental.

Até os anos 20, a marijuana era consumida pelas camadas mais pobres da população, especialmente os negros e latinos. Não representava problema social. Na década de 20, no entanto, a cadeia de jornais de William Randolph Hearst começou uma campanha para criminalizar o uso da maconha. Tornaram-se comuns as manchetes de acidentes de carros nos quais era encontrado um cigarro de maconha. Hearst também usou a droga para pintar um quadro mostrando os mexicanos como preguiçosos maconheiros. Tudo porque o governo mexicano lhe havia confiscado uma propriedade. As publicações do magnata também afirmavam que os negros que violentavam brancas o faziam sob o efeito da Cannabis. Reportagens retratavam negros e chicanos como bestas enlouquecidas sob a influência da maconha, que tocavam uma "música satânica" (jazz).

Isso levou o Departamento do Tesouro americano a instituir um proibitivo "imposto da marijuana" em 1938 e o Congresso começou as audiências para passar uma lei proibindo o consumo. Em 1948, membros do comitê do Congresso que examinava as atividades comunistas nos EUA alegaram que a maconha deixava seus usuários pacíficos – e pacifistas! –, e que os soviéticos poderiam usar a erva para tirar a vontade de lutar dos americanos, tornando o país uma nação de zumbis. Logo, quase todos os países do mundo adotaram legislação repressiva à Cannabis. Finalmente, por iniciativa dos EUA, da Venezuela, do Brasil e de Gana, a maconha entrou na Carta de Princípios da ONU como um inimigo a ser combatido e debelado e seu consumo vedado nos países signatários e membros da organização.

Baseado na moda

Milton Abrucio Jr.

Parte de uma pesquisa mundial da Organização das Nações Unidas (ONU), dados coletados pelo sociólogo Guaracy Mingardi, da Escola de Sociologia e Política de São Paulo, ajuda a rever mitos sobre o consumo e tráfico de drogas na maior cidade do País. Mostram que, em tempos de pavor com entorpecentes pesados como o crack e a heroína, a droga do momento voltou a ser a maconha. Apesar de mais barata que a cocaína, a maconha lidera o ranking de apreensões nos bairros de classe média alta como Pinheiros. Ali houve, no segundo semestre de 1996, um número duas vezes maior (20) de apreensões de maconha, com relação às de cocaína (nove). O quadro se repete nas regiões do Jardim Paulista e Ibirapuera. Já em um bairro popular como o Jaçanã, a relação é inversa – houve 17 casos em que foi encontrada cocaína, contra nove de maconha. "Isso acontece porque o consumo de drogas é muito influenciado pela moda. A maconha volta com tudo entre os jovens abastados, depois dos exageros com a cocaína e casos esporádicos de viciados em crack e heroína", diz Mingardi.

A disseminação da maconha entre adolescentes é confirmada por uma pesquisa da Escola Paulista de Medicina. Entre 15 mil estudantes, 7,6% deles admitem ter experimentado maconha, percentual menor apenas do que os solventes como a cola de sapateiro (13,8%) e bem à frente da cocaína (2%) e da categoria na qual se encaixa o crack (0,7%). Embora o crack já ameace tomar da cocaína o segundo lugar no ranking de apreensões, o problema é bastante regionalizado. Em apenas uma das oito regiões em que a polícia se divide na cidade, o crack supera a maconha e a cocaína. É a região do centro velho, onde fica a chamada "cracolândia", onde foram feitas 164 das 360 ações nas quais a polícia encontrou crack. Ali, a droga é consumida nas ruas, principalmente por menores. "É estranho a polícia não deter um fenômeno tão localizado", questiona Mingardi.

Fonte: http://www.terra.com.br/istoe/ciencia/148238.chtm
 

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