sexta-feira, 27 de junho de 2003

Estudo diz que maconha não provoca danos cerebrais

27 de junho de 2003, Terra - Notícias

Pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego (EUA) afirmaram hoje que fumar maconha altera as funções cerebrais, mas não provoca danos permanentes. "A descoberta foi de certa forma surpreendente. Esperávamos detectar maiores danos nas funções cerebrais mais apuradas", disse Igor Grant, principal autor do estudo. Outras drogas ilegais, e mesmo o álcool, provocam danos cerebrais.

A equipe dele analisou dados de 15 estudos publicados anteriormente a respeito dos efeitos de longo prazo do uso recreativo da maconha sobre a capacidade neurocognitiva dos adultos. Os estudos aplicaram testes mentais em usuários da maconha, mas não quando estavam sob o efeito da droga, afirmou Grant.

Os resultados, publicados na edição de julho da revista Journal of the International Neuropsychological Society, mostram que a maconha produzia um dano de longo prazo apenas marginal, afetando pouco as capacidades de aprendizado e memória. E nenhum efeito foi registrado em outras funções, entre as quais o tempo de reação, a atenção, a linguagem, a habilidade de argumentação e as capacidades motora e perceptiva.

Conforme Grant, a descoberta é particularmente importante em meio a questões sobre a toxicidade cumulativa da droga no momento em que vários Estados norte-americanos estudam a possibilidade de autorizar o uso medicinal da substância. O estudo, envolvendo 704 usuários antigos da maconha e 484 não-usuários, foi patrocinado por um programa do governo que supervisiona pesquisas sobre o uso da maconha como medicamento. Há indícios de que a droga ajuda a aliviar a dor em doentes com, por exemplo, esclerose múltipla e a controlar a náusea em pessoas com câncer.

Fonte: Terra – Notícias (27 de junho de 2003)

terça-feira, 24 de junho de 2003

Uma voz isolada no Congresso

24 de junho de 2003, The Narco News Bulletin

Karine Muller

Andando pelos corredores do Congresso Nacional, qualquer um pode perceber ecos de aprovação de emendas constitutivas, projetos e leis. Há ali o movimento de políticos intitulados como representantes do poder público, uma vez que foram eleitos pelo povo. Mas, nas entrelinhas, para além desta atividade burocrática obrigatória no andamento administrativo do país, quem são as vozes isoladas do Congresso?

Uma delas certamente é a do senador Jefferson Péres, representante do estado do Amazonas e membro titular da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do senado. Um dos poucos a fazer pronunciamentos a favor da legalização de drogas no país.

Em tempos de discussão sobre segurança pública, narcotráfico e crime organizado, fui saber do senador, a respeito de alguns temas relativos a estas questões.

Karine Muller - Debate sobre descriminalização das drogas no Congresso.

Jefferson Péres - Não há um debate oficial a respeito da legalização das drogas. Há alguns pronunciamentos isolados. Às vezes mesas de debates são convocadas esporadicamente. Debates sistemáticos e constantes sobre drogas, não acontecem. Creio que sou uma voz isolada.

Karine Muller - Campanhas antidrogas veiculadas na mídia.

Jefferson Péres - Tenho a impressão de que a maioria delas não faz efeito nenhum. Não acredito que campanhas antidrogas convençam adolescentes ou jovens a deixarem o consumo de drogas. Há pessoas que nascem com tendência ao álcool, às drogas e campanhas televisivas têm um efeito muito pequeno sobre elas.

Karine Muller - Repressão ao usuário de drogas.

Jefferson Péres - A repressão é pior ainda. Mas, enquanto for proibido tem que haver a repressão policial, embora eu acredite que é uma guerra perdida contra o narcotráfico. Parto do pressuposto que sempre haverá distribuidor de droga. Enquanto houver consumidor, sempre haverá fornecedor. Pode-se mobilizar a polícia, o exército, a marinha e a aeronáutica que não se extingue nem o consumo e nem o tráfico de drogas.

Karine Muller - SENAD (Secretaria Nacional Antidrogas).

Jefferson Péres - O modelo estadunidense deveria servir para o mundo inteiro como mau exemplo. A experiência me mostra que é inútil combater as drogas via repressão. Nenhum país tem o poderio financeiro dos EUA e nem tanto aparato policial. Patrulham o litoral, a fronteira com o México, possuem o DEA e gastam alguns bilhões de dólares nisto tudo. Entretanto, eles são o maior consumidor de drogas do planeta. Então eu me pergunto, se o país mais poderoso do mundo não consegue combater as drogas, como é que os outros vão conseguir?

Karine Muller - Legalização total das drogas.

Jefferson Péres - Poderíamos legalizá-las gradativamente começando pelas mais leves, como a maconha, passando em seguida pela cocaína até chegar nas outras. Sou a favor da legalização das drogas em escala universal, não somente no Brasil. Se todos os países legalizassem as drogas, eles poupariam o dinheiro que gastam na repressão sem êxito. Reduziriam a corrupção que o narcotráfico promove. A polícia, o poder judiciário, o meio político, o sistema penitenciário, tudo é corrompido pelo narcotráfico. Com a legalização, a briga entre quadrilhas, a “queima” de arquivos, a corrupção com o aparato estatal e a violência de modo geral, diminuiriam. E ainda poderia se cobrar um imposto sobre a produção de drogas que seria revertido no tratamento a dependentes químicos e em campanhas educativas, embora eu não acredite nelas.

Karine Muller - O Estado como repressor.

Jefferson Péres - A maioria das pessoas têm medo de dizer isto. Trata-se de um princípio ético. O Estado tem o direito de impedir que uma pessoa adulta faça da sua vida o que bem quiser? Eu acho que não tem. Se uma pessoa adulta quer consumir drogas, quer se destruir, a vida é dela. Por que o Estado tem que impedir isto repressivamente?

Karine Muller - Um tabu no Congresso.

Jefferson Péres - Quando eu faço pronunciamento sobre a legalização das drogas, muitos param para pensar e dizem que logicamente é isto mesmo, mas não têm coragem de ir além disto. O medo, a censura social é muito grande. Então só se pensa mesmo em repressão.

Karine Muller - O que sustenta o narcotráfico?

Jefferson Péres - O narcotráfico é sustentado pela proibição. Precisamos distinguir duas coisas. A primeira é o consumo de drogas, que sempre existiu e vai existir na humanidade. A segunda é o narcotráfico que vive em função não do consumo, mas da proibição. Se você acaba com a proibição, libera o consumo, pondo fim ao comércio ilegal. Esta é a única maneira de acabar com o narcotráfico. Não estou defendendo nenhuma tese. É um fato. O narcotráfico existe porque é proibido. Se não for proibido, é legalizado e o comerciante ilegal não vai querer vender pra pagar imposto. Então o narcotráfico morre. Ele é fruto da proibição.

Karine Muller - A questão da fronteira.

Jefferson Péres - Atualmente se discute muito sobre a questão da fronteira e sobre o comércio ilegal de armas que está ligado ao narcotráfico. O Brasil tem uma fronteira enorme. Faz fronteira com o Peru, a Bolívia e a Colômbia que são produtores de drogas. Na Colômbia temos narcoguerrilhas que precisam comprar armas. Pessoas aqui no Brasil contrabandeiam armas para lá em troca de drogas. As coisas estão muito ligadas e, com uma fronteira de milhares de quilômetros, fica impossível “vigiar” tudo isto com um exército desguarnecido.

Karine Muller - Uso das forças armadas no combate ao narcotráfico.

Jefferson Péres - As forças armadas podem ajudar a guardar nossa fronteira, mas não estão preparadas para combater o narcotráfico. Isto é tarefa de polícia. Se nós usarmos o exército, vamos apenas corrompê-lo. Há atualmente milhares de armamentos desviados de quartéis do exército, certamente por soldados que vendem para os narcotraficantes. O contato direto destes soldados com o narcotráfico, faz com que sejam facilmente corrompidos por ele. Para um soldado que ganha R$ 800 (cerca de US$ 250) por mês, fica difícil de resistir a uma propina de R$ 10.000 (cerca de US$ 3.000), por exemplo. Assim como para um oficial que recebe R$ 5.000 (cerca de US$ 1.600) por mês, uma propina de R$ 50.000 (cerca de US$ 15.000), também é irresistível. Temos que deixar o exército longe deste assunto.

Karine Muller - A luta no Congresso.

Jefferson Péres - Eu nem estou em luta. Apenas expresso a minha opinião. Não posso desfraldar a bandeira brasileira. Recebo e-mails de pessoas me questionando sobre como posso defender o consumo de drogas no país. E eu apenas defendo a legalização das drogas porque quero acabar com o narcotráfico. Infelizmente, isto é um problema cultural.

Fonte: http://www.narconews.com/Issue30/artigo805.html

segunda-feira, 23 de junho de 2003

Campanha antidrogas na tevê é ineficiente, diz estudo da USP

23 de junho de 2003, Agência Carta Maior

Maria Paola de Salvo e Adélia Chagas

A eficácia das campanhas antidrogas na TV - discutida informalmente - virou pesquisa. E a conclusão é desanimadora: as mensagens são ineficientes. A afirmação é da tese de mestrado da professora de Comunicação Social Arlene Lopes Sant'Anna defendida no departamento de Lingüística da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP).

As razões da ineficácia, segundo o estudo, são o erro no foco social, ingenuidade, superficialidade, autoritarismo do discurso, além do fato de as campanhas ignorarem as origens do problema e não esclarecerem sobre a prevenção.

A professora de Comunicação Social da PUC-PR analisou 20 anúncios do período de 1996 e 1997 feitos pela ONG Associação Parceria Contra as Drogas (APCD), responsável pela maioria das campanhas e das veiculadas atualmente.

Na avaliação de Arlene, a análise das campanhas ser focada nos anos de 1996 e 1997 não desatualiza a conclusão. "Não deixei de observar as posteriores. E são ineficientes do mesmo jeito", diz. Isso porque, segundo ela, o discurso é o mesmo. Das 20 propagandas estudadas, metade aconselhava os telespectadores a evitar a experiência e o restante incitava o usuário a abandonar o uso.

"Nos dois tipos, o discurso é superautoritário, intimidador e há a mensagem de castigo. Se parar de usar a pessoa ainda tem uma chance e se não usar, não vai morrer, não vai virar vegetal", diz. Ela também atribuiu a falta de resultados à distância da realidade de quem faz os anúncios. Uma surpresa para a professora, que descobriu durante o estudo que a autoria dos anúncios nada tinha e tem a ver com o governo.

A pesquisadora constatou também que a ONG é incentivada pela embaixada estadunidense que propôs a um grupo de empresários brasileiros a realização de uma campanha associada à Partnership for Drug-Free América, entidade estadunidense, que já integrou outros países. A campanha foi lançada também na Argentina, Chile, Venezuela e Porto Rico.

"Eu caí das pernas. É por isso que não dá certo. A impressão é que o Brasil se submete demais ao capital internacional e a produção é feita nos moldes internacionais", diz. "As propagandas tentam mais uma vez proteger a classe média e ignoram as mais baixas, que são as grandes consumidoras e descobrem que é uma forma de ganhar dinheiro", diz.

Arlene fala das classes mais pobres baseada no levantamento, da época da veiculação dos anúncios, do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID). A situação mais dramática era a dos meninos de rua - no Rio de Janeiro 57% deles já haviam usado drogas; no Recife, o número chegava a 90%.

Dirigir a campanha para a classe média-alta também não condiz com o público atingido pela televisão: segundo os dados do IBGE, mencionados na pesquisa, mais de 60% das pessoas que se informam através da TV são das classes C e D.

Outro ponto destacado pela professora é o fato de as propagandas não trazerem informações mínimas sobre como e onde procurar tratamento e o que fazer. A pesquisadora critica também o fato de as "drogas serem mostradas como se surgissem do nada, como se tivessem vida própria e buscassem a próxima vítima, como se fossem o bicho papão para punir jovens desavisados".

Arlene não está sozinha na sua crítica. Primeiro secretário nacional antidrogas, entre 1998 e 1999, o magistrado aposentado Walter Fanganiello Maierovitch faz coro às conclusões da pesquisadora.

Para ele, as campanhas veiculadas pela ONG APCD têm como base a demonização das drogas e a inibição do uso pelo medo, com o único objetivo de se evitar o primeiro contato do jovem com as substâncias.

"O Brasil importa o modelo estadunidense de política antidrogas e adota o mesmo discurso incriminatório e penalizante dos que já fazem uso lúdico ou são dependentes. Isso traz inadequações ao público brasileiro", avalia Maierovitch.

Segundo o ex-secretário, a culpa atribuída ao usuário pelo crime organizado e violência urbana - como aparece nas propagandas atuais da APCD na TV "Quem usa drogas financia a violência" - representa mais uma tentativa oportunista estadunidense que, pela desinformação e pânico no Brasil, procura conquistar a opinião pública. "Enquanto o foco da culpa se concentra no consumidor de drogas, bilhões de dólares sujos são reinvestidos nos sistemas bancário e financeiro internacionais, sempre fora do foco", aponta.

A Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) não desenvolve atualmente nenhum tipo de campanha contra as drogas. A tarefa fica a cargo apenas de ONGs, como a Associação Parceria Contra as Drogas. Segundo Maierovitch, isso sempre foi assim, desde a inauguração da SENAD em 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso. "O governo nunca destinou nenhuma verba para mídia, campanhas, nada. Para o governo, isso não era relevante".

Maierovitch acredita que a fórmula para a eficácia das campanhas antidrogas está na informação inteligente desvinculada do medo e do autoritarismo, e deve falar a todas as classes sociais. "Elas devem buscar a conscientização e a educação", diz.

Eficiência do discurso

O presidente da APCD, o publicitário Paulo Heise, acredita que às vezes é necessário lançar mão do medo e do discurso autoritário para inibir o consumo de drogas. "Reconheço que às vezes usamos o autoritarismo. Mas o que realmente funciona em campanhas publicitárias deste tipo é trabalhar com a percepção de risco propiciado pelo uso das drogas. Se o adolescente não tiver percepção disso, vai usar drogas". Segundo ele, o objetivo principal das campanhas da APCD é evitar o primeiro contato dos jovens com a droga e o uso recreativo, e não acabar com o tráfico. "Não é nosso objetivo tirar do tráfico um jovem do Capão Redondo, por exemplo", explica.

Com sete anos de atuação e 56 filmes veiculados, a ONG conta com o apoio de emissoras de TV para veicular gratuitamente as propagandas nas emissoras abertas e a cabo. "Nesse ponto somos mais eficientes que o Estado. A Rede Globo é nossa parceira. Quando o governo iria conseguir gratuidade das emissoras se fosse o formulador das campanhas?", analisa Heise. Para ele, a SENAD deve focar seus esforços em políticas de erradicação do tráfico e das drogas.

A APCD defende a política atual que considera a compra, a venda e o porte da maconha um crime. "Descriminalizar teria o único efeito prático de eliminar uma barreira para os negócios dos traficantes", avalia o presidente da ONG.

De acordo com a ONG, a população brasileira percebe um impacto positivo na atual campanha que mostra a violência causada pelas drogas e procura identificar o usuário como co-responsável por financiar o tráfico e o crime organizado. A avaliação é baseada em pesquisa do IBOPE de março de 2003.

Dos entrevistados, 45% conheciam alguém que havia parado de usar algum tipo de droga. Mas 80% não conheciam ninguém que havia parado com o uso, depois de ver na campanha que o dinheiro iria para os traficantes.

A Agência Carta Maior procurou a SENAD e o Ministério da Saúde para comentar a tese da professora e a falta de campanhas. Nenhuma das pastas retornou as ligações.

Fonte: http://www.gabeira.com.br/causas/subareas.asp?idArea=1&idSubArea=191
 

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